O bom senso e a coerência nas decisoes sobre a TV Digital

Por André Barbosa Filho*, no Blog ABFDigitalinteratividadenatvdigital78380
 
Os últimos meses, ao longo das reuniões do Grupo de Implantação do Processo de Redistribuição e Digitalização de Canais de TV e RTV (GIRED), pude constatar mais alguns comportamentos corporativos que me dão a exata dimensão do equilíbrio tênue em que vivemos na atualidade.Fatos, que mesmo a boca pequena, são ditos individualmente como consensuais, e na verdade se escondem nas afirmações em prol de interesses, digamos, legítimos, porém sem perspectiva e sem sequer uma dose de audácia e risco.Diga-se, como uma tendencia contraria, que as empresas da nova economia dão destaque a busca pela inovação e o consenso nos encontros ou “matches” entre nichos que se caracterizam por gostos e comportamentos, por vezes, nada semelhantes. O objetivo e gerar o “novo”, ir aonde ainda não se ousou ir.

O comportamento conservador defende decisões econômicas pontuais, sem riscos de mexer no estado inercial em contrapartida ao estado da arte, pautados pelos mecanismos de retorno do investimento, pautado pelo mundo especulativo, sem coerência com o mundo produtivo.

Muito importante tem sido o posicionamento do Sr. Ministro das Comunicações pelas declarações translúcidas e coerentes a sua biografia a favor da interatividade plena na TV Digital.

O mesmo se aplica a Anatel por sua competência em gerenciar este e outros tema referentes a migração digital na plataforma TV.

As posições das autoridades em atenção aos documentos legais em vigor como os decretos e portarias que expressamente defendem a implantação da TV Digital no Brasil como instrumentos de inclusão digital através da interatividade, destacando-se ai o seu modelo pleno com canal de retorno, trouxe o equilíbrio necessário para a construção de uma decisão justa e viável quanto a escolha das caixas conversoras.

Como, em verdade, as instituições envolvidas públicas ou privadas poderiam ser avessas a um programa que utiliza o mais popular dos meios comunicacionais que leva o mundo digital através da TV aos que não possuem acesso as maravilhas tecnológicas da Internet?

Some-se a isso, o uso dos celulares com acesso a Internet, utilizado como plataforma de interatividade e já presente em quase todos os lares brasileiros.

Entretanto, em reuniões fechadas aparecem defesas veementes de posições inconfessáveis. É do Mundo, diriam…. Entretanto, não são as de um mundo justo em oportunidades que queremos construir.

Entendemos estar vivenciado o limiar de um movimento histórico em direção a uma mudança radical no fazer e no participar dos meios digitais convergentes, incluindo, entre estas, a TV Digital Pública Interativa.

A iniciativa da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) através do projeto Brasil 4D é pioneira na proposição de uma comunicação interativa convergente, materializando toda a pujança da produção e transporte de conteúdos desta plataforma audiovisual, através de sua massificação pelas emissoras publicas e quiçá, comerciais.

Trata-se de um projeto de inclusão social e digital através da transmissão de conteúdos audiovisuais e aplicativos utilizando linguagem híbrida e multimídia, voltado para grupos de baixa renda como, por exemplo, os beneficiários do programa Bolsa Família que reúnem 14 milhões de famílias em todo o Brasil.

O bom senso prevalecerá nestas discussões finais e teremos razoes de sobra para comemorar este passo gigantesco da sociedade na tentativa da diminuição da assimetria do conhecimento que nos envergonha e nos desafia.

*André Barbosa Filho é superintendente Executivo de Relacionamento na EBC – Empresa Brasil de Comunicação.

O problema é bem maior que um marco regulatório para a mídia eletrônica

andersonsantosufalPor Anderson Santos[1]

Já comentei isso em alguns momentos e em outros espaços. Infelizmente, parece que só se percebe o posicionamento de classe das elites proprietárias de grandes grupos de comunicação a cada período eleitoral – marcadamente durante as eleições para o cargo de presidentx da República.

Esta eleição elevou esse patamar a um nível maior. As tais intervenções em maior quantidade na entrevista com a presidenta Dilma Rousseff, com direito a suposto dedo levantado por Patrícia Poeta no Jornal Nacional; e a já “tradicional” divisão de tipo de conteúdo – bem marcada pelos estudos do Machetômetro no Rio – ampliaram essa percepção e a necessidade, mesmo por parte de pessoas influentes no Governo (e articuladores da coalizão de classes que comanda o país com o PT na principal cadeira, caso do ex-presidente Lula), de se realizar um novo marco regulatório para a radiodifusão de transmissão gratuita.

Ainda que sigamos pessimistas quanto ao tema, dado o histórico de 12 anos sem qualquer tipo de avanço, não é bem esse assunto que tocaremos neste texto. Até porque o ápice de tentativa de interferência numa disputa tão acirrada quanto esta não veio da mídia eletrônica, mas de um impresso.

Adiantar o lançamento da edição da revista e divulgar a frase de um delator que nem o advogado dele confirmou sobre um suposto conhecimento da presidenta Dilma e do ex-presidente Lula nos casos de corrupção na Petrobras foi prova cabal, para os “cegos de ocasião”, sobre qual formação ideológica é a principal da Revista Veja, do cambaleante Grupo Abril.

A presidenta/candidata Dilma Rousseff usou os minutos finais da sua última aparição em rádio e TV para criticar o que ela chamou de “terrorismo eleitoral” feito pela revista, que já havia feito isso em eleições anteriores.

Sobre a fala de Dilma, relembrei os momentos com xs amigxs do programa da Rádio Unisinos FM Periscópio da Mídia. Algumas vezes questionamos os governos dito progressistas que seguiam bancando as tais mídias “golpistas” com os recursos de publicidade estatal – no caso dos “blogueiros sujos”, diga-se, parte ínfima da verba só foi para eles a partir do último ano de governo Lula, com Franklin Martins na Secretaria de Comunicação Social.

Se a presidenta reconhece o “terrorismo eleitoral” e os mecanismos espúrios da principal revista em termos de circulação do país, por que as estatais/empresas mistas seguem a mantendo com publicidade? Se não me engano, numa das edições do Periscópio comentamos que duas páginas por edição de Veja custariam R$ 1,5 milhão. E lá podemos encontrar Caixa, Petrobras, BB e etc…

Pegando os dados do Mídia Dados 2014, dos 15 maiores anunciantes do Brasil, 3 são ligados ao Governo Federal: 5º Caixa (3º em revistas); 6º Petrobras (4º em revistas); e 12º Banco do Brasil (6º em revistas).

Além disso, há a compra de assinatura de revistas para escolas, bibliotecas e outros espaços públicos, que ajudam a alimentar as receitas de um grupo supostamente golpista.

Vale ressaltar que se precisa levar em consideração que caso se tratasse de divulgação de obras públicas para os cidadãos, é claro que é necessário que isso seja feito através de meios de grande circulação. Porém, fica-se numa sinuca de bico: paga-se publicidade para difundir num espaço que muitos leem ao mesmo tempo em que quem lê, e a linha editorial de tal meio, é direcionado para combater a si, que anuncia.

Um processo assim não se trata de censura, mas de verificar qual o interesse público que determinado meio de comunicação pretende atender, se é que atende. Explicando o caso da RCTV na Venezuela, como se tratava do espectro eletromagnético, público, o que houve foi a não renovação da concessão, encerrada em 2007; não um corte imediato de sua programação – que, se fosse neste sentido, teria ocorrido em 2002, após a tentativa de golpe, com total participação dos grupos midiáticos, contra Hugo Chávez, presidente eleito democraticamente.

Como se trata de mídia impressa, logo não é uma concessão pública, uma regulamentação da comunicação não necessariamente atuará sobre ela. O que os movimentos pela democratização da comunicação lutam hoje, por exemplo, é por um “Projeto de Lei de Iniciativa Popular da Comunicação Social Eletrônica”. Necessidade esta até mesmo do setor de radiodifusão, já que a última alteração no Código Brasileiro de Telecomunicações, que o rege, ocorreu em 1967 – com muita alteração tecnológica a partir daí, para não entrar no mérito de abrir novas formas de concorrência.

No caso do impresso, o direito de resposta estava previsto na Lei nº 5.250/1967, a “Lei de Imprensa”, que previa punições a supostos excessos cometidos pelos profissionais da comunicação no exercício de suas atividades. O Supremo Tribunal Federal considerou improcedente a lei em 2009, por não se coadunar com o que está escrito na Constituição Federal, promulgada em 1988. Desta forma, o caminho para pedir direito de resposta, como no caso da então candidata a presidenta, complicou-se ainda mais.

Evidente que também precisa ser considerado o efeito de uma notícia deste nível. Mesmo que a revista publicasse o direito de resposta na edição seguinte, ocupando o mesmo espaço que a matéria (quiçá também na capa), a informação já fora propagada e os efeitos disso já foram despertados em parcela da população que teve acesso, seja comprando a revista ou vendo a capa nas mídias sociais. Efeito pior ainda por se tratar de vésperas de uma votação. Não haveria como remediar.

Fazer como a Veja fez no dia seguinte à publicação, colocando a resposta apenas no site do periódico, é ruim, pois não se tratou do mesmo espaço de publicação. Pior ainda porque a revista respondeu o direito de resposta, algo impensável – quer dizer, menos para quem se acha como um candidato no pleito, com direito a tréplica…

Por isso que lutar por políticas públicas para a área e pela democratização da comunicação nos marcos que os movimentos dedicados ao tema fazem não é o suficiente. É óbvio que não dá para negar a importância de seguir lutando por uma regulamentação e uma regulação que garantam expressões mais democráticas, mais justas num espaço que é público. Mesmo nesse nível a luta já será gigante, vide o que falou o suposto candidato a presidente da Câmara, que prometera engavetar qualquer proposta sobre regulação da mídia e é do partido do vice-presidente da República, o PMDB – que também abarca políticos sócios ou donos de concessões, algo inconstitucional.

Mesmo assim, é preciso ter a noção de que uma comunicação efetivamente emancipatória só virá sob outros marcos societários. Que lutemos por mais direitos, mas sem esquecermos qual o objetivo final, o da emancipação humana. Um desafio ainda maior, com certeza.

[1] Professor da Universidade Federal de Alagoas. Jornalista, mestre em Ciências da Comunicação e membro do grupo de pesquisa CEPOS.

Do controle remoto à regulação econômica: o setor das comunicações no segundo governo Dilma

Paulo-Victor-MeloPor Paulo Victor Melo[1]

Dado o papel desempenhado pela mídia hegemônica nas eleições presidenciais deste ano, a reeleição de Dilma Rousseff à presidência do Brasil simbolizou também uma derrota do oligopólio midiático nacional. Não faltaram situações que mostram como, durante toda a campanha eleitoral, os principais veículos de comunicação do país atuaram permanentemente e de forma articulada contra a candidata da situação.

Um primeiro exemplo: uma pesquisa realizada pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – intitulada Manchetômetro – que monitorou diariamente a cobertura das eleições 2014 nos impressos Folha de S. Paulo, O Globo e o Estado de São Paulo, e no telejornal Jornal Nacional, demonstrou que todo o conjunto da mídia privado-comercial fez a opção de se colocar contra a candidatura do governo. Na semana de 7 a 13 de setembro, por exemplo, apenas o Jornal Nacional veiculou 23 matérias contrárias a Dilma, enquanto apenas duas inserções negativas sobre Aécio Neves e uma sobre Marina Silva. Os próprios coordenadores do Manchetômetro, em artigo sobre a cobertura dos veículos das Organizações Globo, chegaram a conclusão que “tanto o Jornal Nacional quanto o periódico O Globo cobrem as eleições de maneira fortemente enviesada, dedicando um número desproporcional de matérias negativas à Dilma Rousseff e ao seu partido, o PT. Ao mesmo tempo, blindam os candidatos da oposição, limitando-se a noticiá-los de forma neutra”.

Como se não bastasse a constante campanha oposicionista da mídia durante os três meses de campanha eleitoral, na reta final do segundo turno (apenas dois dias antes das eleições), como uma última cartada, a Revista Veja estampou em sua capa (que teve a publicação adiantada em dois dias, cabe lembrar) uma suposta denúncia contra Dilma e Lula. Não demorou muito para vir a confirmação de que aquela edição da Veja tinha um objetivo certo: servir de panfleto contra Dilma Rousseff. O ministro Admar Gonzaga, do Tribunal Superior Eleitoral, que concedeu direito de resposta ao PT, em caráter de liminar, e proibiu a veiculação de publicidade da revista em rádio, televisão, outdoor e propaganda paga na internet, foi claro em sua sentença: “tendo em vista que a representada (revista Veja) antecipou em dois dias a publicidade da revista, entendo que a propagação da capa, ou do conteúdo em análise, poderá transformar a veiculação em verdadeiro panfletário de campanha, o que, a toda evidência, desborda do direito/dever de informação e da liberdade de expressão”.

Importante frisar que, longe de ser uma posição adotada exclusivamente durante a campanha eleitoral, a pesquisa Manchetômetro e a capa da Veja apenas confirmaram que a mídia hegemônica está seguindo o que disse a presidente da Associação Nacional de Jornais, Judith Brito, em artigo no O Globo de 18 de março de 2010: “…esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país”.

Mas, se Globo, Veja e todo o oligopólio da mídia saíram derrotados nas eleições deste ano, não se pode afirmar o mesmo durante os doze anos de governos do PT. Nesse período, um dos setores que não teve o seu status quo abalado foi justamente o das comunicações. Ministros alinhados aos radiodifusores (Hélio Costa) ou às operadoras de telecomunicações (Paulo Bernardo), manutenção da grande fatia do bolo das verbas de publicidade para as mesmas empresas (ainda que tenha ampliado a quantidade de veículos que as recebem, se comparado aos governos anteriores), ausência de uma política efetiva para a comunicação pública, perseguição às rádios comunitárias e pouco diálogo com o movimento pela democratização das comunicações foram a tônica dos quatro anos de governo Dilma e dos oito anos de Lula para o setor.

Nesse sentido, não seria espantoso acreditar que – mesmo com a experiência da recente campanha eleitoral – o próximo mandato de Dilma, que governará num cenário de crescimento da oposição (o resultado das urnas mostra isso) e de aumento do grau de conservadorismo do Congresso Nacional (com a presença ativa de deputados e senadores que controlam diretamente emissoras de radiodifusão), não levará a frente qualquer mudança estrutural num setor que, desde a promulgação do Código Brasileiro de Telecomunicações, em 1962, se modifica apenas aos interesses do mercado.

Porém algumas manifestações do PT e de Dilma, durante a campanha eleitoral e após a sua reeleição, sinalizam para a possibilidade do enfrentamento ao oligopólio da mídia ser uma realidade no governo que iniciará em janeiro de 2015. Lembremos: em dois debates entre os presidenciáveis, na Bandeirantes e na Record, Dilma defendeu a regulação econômica do setor; em uma das primeiras entrevistas como presidenta reeleita, no SBT, voltou a pautar o tema;  no último programa eleitoral de TV, ao melhor estilo brizolista, Dilma respondeu incisivamente à Veja; e na primeira reunião da sua Direção Nacional após a vitória de sua candidata, o PT definiu a elaboração de um novo marco regulatório das comunicações como uma das prioridades do próximo mandato.

Otimismo? Pode ser. Mas se lembrarmos que a mesma Dilma, em 2010, afirmou que o único controle da mídia era o controle remoto, ouvir este ano as suas posições favoráveis à regulação econômica do setor e as suas críticas categóricas à postura da Veja, em redes nacionais de televisão, faz crer que está aberta uma nova janela de oportunidades para a necessária democratização das comunicações.

[1] Paulo Victor Melo, jornalista, mestre em Comunicação, militante do Intervozes e pesquisador do Observatório de Economia e Comunicação da Universidade Federal de Sergipe.