A Revista Disertaciones, editada conjuntamente pela Universidad del Rosario de Colombia, Universidad de los Andes da Venezuela e Universidad Complutense de Madrid da Espanha, está com chamada aberta até o dia 15 de maio para o dossiê “Comunicação indígena na América Latina”, que comporá o número 2 do volume 11 do periódico (Jul-Dez. 2018).
Os coordenadores da edição são: Alejandro Barranquero Carretero (Universidade Carlos III de Madrid) -abarranq@hum.uc3m.es- e Eva Tanco (Centro de Investigação Internacional para a Participação e a Mudança Social) – tanco.eva@gmail.com.
Ementa
Este número da Revista Disertaciones está dedicado à apresentação de estudos empíricos – de caráter qualitativo, quantitativo ou misto – acerca das diferentes manifestações da comunicação indígena na América Latina. Nas duas últimas décadas os movimentos indígenas da região têm se situado à vanguarda do pensamento crítico e a intervenção social, em aberto desafio à herança moderna/colonial/capitalista e a sua ênfase na racionalidade instrumental, desenvolvimentista e depredadora da natureza. De fato, diferentes informes vêm contatando a viabilidade dos saberes e práticas indígenas à hora de apresentar vias de transição para a regeneração dos vínculos sociais e do ser humano com o entorno natural, em especial para fazer frente à crise sistêmica (política, econômica, ecológica e cultural) que afeta o planeta.
Ao longo dos séculos XIX e XX, os movimentos indígenas têm sido objeto de atenção de antropólogos e cientistas sociais desde um olhar colonial no que têm estado ausentes os próprios sistemas cognitivos, estéticos e de valoração dos povos. No entanto, desde princípios do XX, as correntes indigenistas têm contribuído a revalorizar as culturas pré-colombianas salvaguardadas em certos territórios, não sem certa tendência ao folclorismo, a modernização e a assimilação ocidental daquelas populações às que tentava-se proteger. O Quinto Centenário do mal denominado Descobrimento da América em 1992 supôs um importante impulso para a reivindicação dos direitos indígenas em torno à ideia de um passado comum (pan-indigenismo) e denominações oriundas como Abya Yala. Já nos últimos anos, as lutas pelo reconhecimento da diferença e as identidades parecem dar passo a reivindicações mais centradas no empoderamento e a aquisição progressiva de direitos civis, sociais e políticos. Bom exemplo deles são os marcos normativos com enfoque diferencial, promovidos pelos primeiros governos puramente indígenas (Equador, Bolívia), se bem estas regulações não sempre têm cristalizado com coerência nas políticas e nas práticas que delas derivam.
No âmbito da comunicação, as primeiras abordagens latino-americanas procedem da antropologia e os estudos culturais dos anos 60, com perspectivas pioneiras e originais como a folkcomunicação e os estudos de meios alternativos/populares/comunitários e de comunicação para a mudança social. Em 1980 o Informe McBride reconhece o direito à comunicação e alenta ao respeito da identidade cultural no marco das políticas de comunicação. No entanto, é preciso esperar às comemorações de 1992 e ao levantamento zapatista no México de 1994 para observar um aumento do interesse científico na temática, que das posições exógenas e romantizadoras do passado começa a transitar a novos objetos e perspectivas como as apropriações digitais das comunidades indígenas ou as primeiras investigações em torno ao que alguns denominam “meios étnicos”.
Sem desestimar estes aportes, a proposta indígena segue ganhando posições nos estudos comunicacionais graças à aparição de espaços próprios de encontro no nível continental – como os Congressos de Comunicação Indígena do Abya Yala (Colômbia, 2010; México, 2013) -, a aparição das primeiras universidades étnicas com estudos em comunicação própria, a vitalidade das organizações de cinema e vídeo comunitário, e o reconhecimento, em algumas legislações (Bolívia), de um “quarto setor” da comunicação baseado na variável identidade.
Não sem dificuldades, a comunicação indígena é hoje um objeto de estudo em alta no que emergem os olhares das próprias comunidades repartidas em países como a Argentina, o Chile, a Colômbia, o México, o Equador ou a Guatemala. Este número de Disertaciones pretende então incorporar perspectivas científicas indígenas, no que o papel da academia ocidental se corresponde com o acompanhamento à incipiente investigação originária. De fato, o dossiê propõe um diálogo entre as diferentes dimensões do “campo” comunicacional: abordagens empíricas (quantitativas e/ou qualitativas) com um sustento teórico e e metodológico sólido, sistematização de trabalhos desde o terreno profissional, e as primeiras reflexões-ações derivadas de estudos de comunicação própria em universidades puramente indígenas. É desde esta tripla perspectiva acadêmica, profissional e docente, sobre a que se traça uma agenda de linhas de trabalho e objetivos, entre os principais:
– Epistemologias e metodologias da comunicação indígena e inter-relação com imaginários e cosmovisões próprias como o Bom Viver / Viver Bem (do kichwa Sumak Kawsay e o aymara Suma Qamaña) e outros construtos autóctones de povos de influência maia, nasa, quéchua ou guarani, entre outros.
– Políticas de comunicação e regulação em relação com os meios indígenas/étnicos e o direito à comunicação dos povos originários (com os seus enfoques e dimensões específicas), assim como o rol das comunidades, organizações e redes na promoção deste direito.
– Sistematização de experiências e práticas mediáticas, comunicacionais e jornalísticas de expressão e/ou reivindicação indígena: cinema e vídeo participativo, rádio comunitária, plataformas online, manifestações artísticas e rituais, etc., em conexão com a questão indígena (política, cultural ou social), para além da mera narração dessas experiências.
– Apropriações tecnológicas e comunicacionais das comunidades indígenas em relação com as TIC -Internet, redes sociais, telecomunicações, etc.- e estudos de brecha digital.
– Processos de comunicação interna nos movimentos indígenas latino-americanos (tomada de decisões em assembleias e mingas, desenvolvimento de liderança e/ou cultura participativa, etc.), abordando desde as formas próprias de construção comunitária até as práticas comunicativas que se dão no seno das organizações e redes.
Inter-relações entre a comunicação indígena e outros campos do conhecimento relacionados como: comunicação para o desenvolvimento/mudança social, comunicação/educação (educomunicação), estudos de mediação social, comunicação ambiental, meios comunitários e cidadãos, semiótica e estudos da linguagem, práticas comunicacionais indígenas em outros territórios do planeta, etc.
– Dentro dos objetivos deste número, não só pretende-se contribuir a valorar os processos de comunicação indígena que se multiplicam na América Latina, mas também que se oferece como um espaço de difusão acadêmica ao mesmo pensamento originário e as suas propostas em relação com a comunicação. Por esse motivo, anima-se a participar especialmente a acadêmicos e pesquisadores, mas também a pensadores/as, líderes e diferentes coletivos indígenas que tenham participado em estudos de campo sobre o tema do monográfico. A intenção final é estabelecer um panorama científico do passado, o presente e os desafios da comunicação indígena, unto com o aporte de práticas de sucesso em justiça social e ecológica, que contribuam ao momento atual de construção de uma proposta alternativa às interações comunicativas ente os seres humanos e com a natureza.
Mais informações em: https://revistas.urosario.edu.co/index.php/disertaciones/index