Por Anderson David Gomes dos Santos*
Talvez a principal coisa que me levou a optar pela Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura (EPC) como base teórico-metodológica para estudos é a possibilidade de análise crítica da sociedade, destacando a importância das indústrias culturais e da cultura nela, de maneira a poder pensar, propor e de alguma forma participar na construção de políticas públicas realmente inclusivas e de transformações sociais radicais.
Trato disto porque neste texto tenho a missão, enquanto responsável pela Coluna CEPOS nesta fase aqui no Portal EPTIC, de mostrar o que pode nos aguardar enquanto pesquisadores da EPC e sujeitos preocupados em uma formatação coletiva de uma sociedade justa, livre e igualitária.
Olhando o que foi publicado neste espaço no ano passado, temos algumas problemáticas mais gerais, que dão força ao perfil do subcampo comentado nos parágrafos anteriores: políticas públicas de cultura, democratização da comunicação, necessidade de pluralidade de vozes nos meios informativos, políticas de educomunicação, diversidade cultural, trabalho cultural, representatividade popular, etc.
Análises que tiveram como objetos: o cinema em países periféricos, museus sergipanos, a concorrência na TV por assinatura em Moçambique, o jornalismo econômico, as TVs universitárias argentinas e brasileiras, os megaeventos esportivos, a judicialização do jornalismo brasileiro, a pauta da democratização no governo brasileiro, a representação dos negros na TV, problematizações sobre o Esquenta!, dentre tantos outros.
Tanto nas problemáticas gerais quanto nos temas mais específicos, a preocupação em trazer para análise objetos do cotidiano, que conformam as pesquisas dos investigadores que fazem parte do grupo de pesquisa OBSCOM/CEPOS (UFS), e tomam como base a Crítica à Economia Política, com a demonstração de algumas das contradições do sistema capitalista que marcam o entorno cultural.
2016 continuará com essa marca, especialmente no caso brasileiro em que a conjuntura política demonstra desde o ano passado que lutar e tratar de questões como as acima apontadas só deve aparecer em curto prazo a partir da organização dos movimentos sociais contra hegemônicos. Isto já ficou claro com o primeiro artigo do ano, de Helena Martins, que tratou das afrontas constantes aos direitos humanos nos programas policialescos.
Sobre o Governo federal, a mensagem da presidenta Dilma Rousseff ao Congresso Nacional trouxe uma frase que gerou diferentes interpretações: “Encaminharemos ainda um novo Marco Regulatório das Telecomunicações, ajustando esse setor ao novo cenário de convergência tecnológica”. De um lado, algumas pessoas que acreditam que isso se trata de uma renovação da regulamentação sobre a radiodifusão gratuita; de outro, quem acredita que se trata do processo iniciado em janeiro de 2015, com consulta popular eletrônica, que modifica a Lei Geral de Telecomunicações.
Confesso estar com quem opta pela segunda opção. É um processo em andamento e que precisa ser aprovado ainda este ano para permitir um resgate da Oi no mercado, retirando as obrigações com infraestrutura e abrindo ainda mais o setor para o caminhar livre da iniciativa privada. Vale lembrar que durante a campanha de reeleição a presidenta usou “regulação econômica” para tratar da radiodifusão. Além disso, vide a pressão atual – que vai muito além da renovação das principais concessão do Grupo Globo na TV aberta em 2018 –, e a escolha político-partidária do ministro das Comunicações na primeira reforma ministerial do segundo governo, parece-me seguir sendo, já há mais de 13 anos, uma briga que o Governo não quer buscar.
Outro campo de disputas é a comunicação público-estatal. A saída de Américo Martins do cargo de diretor-presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) por uma interferência superior, com suposta ordem vinda da Secretaria de Comunicação Social para a transmissão de um jogo do Campeonato Paulista da Série A3 num domingo, demonstra a fragilidade normativa que rege a EBC – algo que foi apontado no Seminário de Modelo Institucional promovido pelo Conselho Curador no ano passado, inclusive, em texto coletivo produzido pelo OBSCOM/CEPOS.
Por outro lado, o anúncio do uso da multiprogramação a partir do sinal da TV Brasil no Rio de Janeiro, que será acompanhado pela NBR, Canal Saúde e TV Escola, ainda que tardia e restrita, é uma prática que demonstra que uma das potencialidades da digitalização da TV aberta pode ser aplicada. Restrita por poder ocorrer apenas no campo público de comunicação, mas que abre possibilidades para mais espaços deste espectro na TV brasileira.
TV Digital, por sinal, que se encaminha para a confirmação do abandono do Ginga e da interatividade, a maior das possibilidades esperadas com esse processo. Com a opção do canal de retorno se dar a partir de TVs conectadas, e não do middleware – inclusive no que o Governo dará aos beneficiários de programas sociais –, o mercado (aqui, também de produção dos aparelhos televisivos) mostra mais uma vez o quanto sua voz é mais escutada na hora das tensões e disputas.
Por fim, é necessário acompanhar o desenrolar do Governo Macri na Argentina, com práticas demonstradas desde o início de mandato de destruição da Ley de Medios, marco para a regulamentação da radiodifusão na América Latina e que costumeiramente usamos como exemplo para como deve ser feito o processo no Brasil. Fatos assim fazem parte da democracia representativa que marca nossos países e demonstram a necessidade de fortalecimento da participação popular e de movimentos sociais na construção sociopolítica cotidiana mesmo sob governos ditos de centro-esquerda e esquerda.
Tem um conjunto de outros objetos de estudo que devem passar por esta coluna em 2016. Aproveitamos, inclusive, para encerrar este texto com um convite aos pesquisadores que investigam a partir da EPC. O Portal EPTIC, em todas as suas seções, mas especialmente esta Coluna CEPOS, é aberto a artigos opinativos para além de quem faz parte do grupo de pesquisa OBSCOM/CEPOS. Basta entrar em contato conosco no perfil do Facebook do Portal EPTIC.
* Anderson Santos é professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), jornalista graduado em Comunicação Social pela UFAL e mestre em Ciências da Comunicação pela UNISINOS, membro do grupo de pesquisa OBSCOM/CEPOS.